domingo, 30 de agosto de 2009

K

via crucis


Desci pelo afago da varanda,
o Sol apagava a última estrela,
mas não cheguei ao final.
Era fugaz a memória do aparecer,
a espinha da noite
a cobrir meus passos,
mas não cheguei ao final.
Vislumbrei, na perspicácia do riso,
três, talvez quatro, aconchegos,
mas não cheguei ao final.
Não houve falas entarameladas,
ou vozes parcas em mistério;
não tive o carinho da viagem,
o resquício da gargalhada,
ou a gentil malga do jejum;
corri pela Grande Muralha,
saltitei no Tecto do Mundo,
cavalguei bestas-feras,
másculo, furei os antípodas,
sem qualquer mácula,

mas não cheguei ao final!!

(foto do autor tirada com telemóvel: serra do Caramulo)

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K










deve ter passado pelo sonho,

pois acordou algemado à liberdade...

(imagens retirada da net: "Gardénias" de Nadir Afonso)



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sábado, 29 de agosto de 2009

K

canto do soldado














Caminho na minha peste,
as solas rebarbam
as tristes folhas
emaranhadas na lama
que me sobra,
naquela paixão
[lasciva...];


dói-me o peito,
o destino e a madrugada,
o capacete escuta a metralha,
seca como a loucura
(prévia)
que torna os homens fugazes;



sigo pelo atalho,
há um oficial ferido
{na sua dignidade de falsete}
sim, meu capitão;
às ordens, meu capitão;
(eu não quero o capitão,
não lhe chamo mais "meu");
as folhas farfalham
e dançam comigo
em trejeitos melancólicos,
e eu sinto o desejo
(atroz, bem o sei)
de polir a arma
até obter um trompete
para então,
entre risos de leite e mel,
tocar em surdina
o Bolero de Ravel!!
(imagem retirada da net)

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sexta-feira, 28 de agosto de 2009

K

clemência

Cabe na palma da mão
o estreito patamar
da loucura
como se fosse
um precipitar
permanente
(excerto do poema "O cabo", publicado por Paula Raposo em "As minhas romãs")

na mão direita a loucura,
na esquerda a absolvição,
solta-se então a conjura
demente, rouca maldição
(imagem retirada da net)

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quinta-feira, 27 de agosto de 2009

K

entrega

naquele Verão, a areia espraiada pelo vento
sucumbiu aos trejeitos baloiçantes das águas

(imagem retirada da net)

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terça-feira, 25 de agosto de 2009

K

vagas












Das brumas da minha tarde
volvi aos pássaros
a pique.
O ares estavam secos,
as juras tinham morrido,
infectas,
repousando,
quais estátuas jacentes,
nas lajes de poemas
já comidos pelo tempo.
Ao fundo,
dois castiçais amortecidos
pelas brisas derramadas
em fugas pendentes;
memórias puídas,
que vagos murmúrios
empedravam
no esquecimento da tua pele...

(imagem retirada da net)

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segunda-feira, 24 de agosto de 2009

K

aparelhagem


Que nada falte em meu barco

de sonhos e espuma feito,

para partir, de bandeira em arco,
rumando ligeiro ao meu peito

(imagem retirada da net)

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sexta-feira, 21 de agosto de 2009

K

na(u)s




Cristalizaste
entre fios esquecidos,
as lianas de naus
que chegaram,
com gritos de partir.
A bordo,
os restos
de velhas equipagens,
a quem a surpresa
já não admirava,
a quem a vista
já trouxera tudo.
Sentiste o bramido
das tempestades,
o silêncio infecto
das eternas calmarias,
os risos dos velames,
os cordames
em bailados estrábicos.
No entanto,
mantiveste-te
cristalizada,
no rugido da nau,
no ventre da proa,
em jeito adormecido;
de facto,
suspensa pelas horas
de um livro vadio,
riscado pelo comandante
a quem já nada devias,
num ror oco
de coisa nenhuma...
(imagem retirada da net)

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K

nocturno

No caminho do lobo,
encostado ao muro,
sigo as pegadas musgosas,
quase feéricas,
fétidas,
de velhos sonhos da floresta.
Em certas noites,
(dizia-se)
abriam-se atalhos,
a Lua descorava
num festim de gloriosas
chuvas áureas.
Arfo entre dois pontos,
suspiro àquela mata,
que recorda tempos
de fantasias lerdas,
de juízos malfadados,
de intrusões malditas.
Os meus passos suam
soluçam,
suspiram
restos de vinganças,
os meus olhos vêem
garupas escoriadas,
visões almoádas
(de quando o califa imperava),
os meus ouvidos ouvem
rezas há muito esquecidas,
um tropel de imprecações;
os tempos alvorecem
na minha frente...
na busca do dia.

{Ditei-te estas palavras...}

(imagem retirada da net, pormenor de
"Noite estrelada" de van Gogh)





































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quinta-feira, 20 de agosto de 2009

K

12º Concurso das Palavras

Ainda em vida
toquei na velha flauta,

cantata liberta

de longos véus escuros.

Já não há maldição;

espantaste todas as vitualhas,

todas,

pelo meu salão escuso.

Amor?

Fugidio,

nem se lhe sentiu a sombra,

nem simplicidade naquele olhar,

escorregadio de coragem, em renúncia.

(…)

Ode à orquídea!

Ao beija-flor que a resgata,

entre dois sulcos de brisa!

No redondel do olhar,

foi tão só um benjamim

ascenso de si,

apenas,

naquele meu salão escuso.

Partilha a tua boca,

apenas.

Tecer frases feitas

é um caminho de tortura,

sem bermas.

Verdade sem tristeza,

por onde, vida,

nos levas,

em melodias

de trevos e vielas?…

(poema com que participei no "12º Jogo das Palavras" organizado no blogue Eremitério. Bem-haja pelas suas iniciativas)

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quarta-feira, 19 de agosto de 2009

K
Porém
Em frente do teu rosto
Medita o adolescente à noite no seu quarto
Quando procura emergir de um mundo que apodrece
(Sophia de Mello Breyner Andresen, "Che Guevara" in "O Nome das Coisas" )

... os dedos passeiam-se pela viola,

os caminhos fecharam-se há anos,

apenas o ar medíocre,

deslavado,

se estende ao seu redor;

o jovem fita,

Che retribui-lhe os olhos,

em desafio felino,

(em jeito de hasta la victoria, siempre!...),

do braço da viola suspiram cantos

de la Sierra,

quase longínquos,

distantes. O Sol vibra,

[em deixas

de esquecimento],

e o mundo apodrece,

em gestos de vaidade,

de pequenina mesquinhez,

enquanto o adolescente

sem entender,

suicida lentamente a esperança,

ornada de trágicas,

secas mortes,

em louvor de coisa nenhuma!


(imagem retirada da net)

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terça-feira, 18 de agosto de 2009

K

miséria


... parecia estar nas brisas,

nos caminhos

debruados a ouro

que aquele Outono

forçava

por aquele Novembro esquecido.

Parecia quase flutuar

impelida para o que ainda nem era seu.

Sempre!

Sempre o seu sentido,

a sua harmonia viscosa.

Não se lhe adivinhavam os passos,

mas estava lá,

gélida...

em vagas de espanto,

- memória ferida,

dos campos de além-mar .

Arrastava as ondas,

os sentires,

as luas até,

em silvos de Estio,

conta-corrente

da nossa miséria...
(imagem retirada da net: pormenor do quadro de
Francisco Metrass "Só Deus")

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sábado, 15 de agosto de 2009

K

pesadelo

Estreei-me nos umbrais do medo,
nas portadas frias,
escorrendo pavor;
apenas os meus passos
nas sombras delirantes
de um vento marcial.
Misturei a areia do tempo
em dois ou três baques
de solidão;
retive a contagem
de caminhos vindouros.
Já nem a taça
derramada sobre as Nações
me encantou ou deslumbrou,
assim como os passos dos féretros,
ou as trilhas escusas.
Meus olhos escaparam-se
em edípicas fugas,
rasteirados pela ânsia do vazio.
Agora,
arrisco um passo
na esperança
de que ainda reste
algum Boja(dor)...
(imagem retirada da net: pormenor de "The nightmare" de Henry Fuseli)


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quinta-feira, 13 de agosto de 2009

K

Pido a mis dioses o a la suma del tiempo
que mis días merezcan el olvido,
que mi nombre sea Nadie como el de Ulises,
pero que algún verso perdure
en la noche propicia a la memoria
o en las mañanas de los hombres.
(Jorge Luis Borges: A un poeta sajón)

Sim, que meus caminhos,
esquecidos,
aquém dos luares
feéricos,
já nem minhas pisadas,
suspiros, olhares
ou sorrisos mostrem;
que nem os ares perfumados,
as maçarocas,
o perfume dos lilases,
a sombra das tílias
tragam nas suas memórias
rasgos ou traços de mim;
no entanto,
se algo perdurar,
que seja um verso,
uma estrofe,
uma palavra afoita
serpenteando
alma acima,
num prazer descalço,
quase pueril...

(imagem retirada da net)


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quarta-feira, 12 de agosto de 2009

K

(fúria...)











(...) ah! Se o mar me tragasse,
me digerisse
e me fundisse todo,
num bárbaro triunfo
de espuma e sal!!!...
(imagem retirada da net)

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K

sonhos à beira-mar


Sorri ao vento
nas suas longitudes,
tão longe estava
que nem o trote
dos corcéis
animava os restos
de sonhos arcaicos
que o assombravam;
marchavam velhos jograis,
pantominas
a cinza,
por mor do luto;
já nem se ouviam as sereias
ou marinheiros gregos;
afinal de quem eram os mares,
os rios,
as águas nascentes,
morrendo nas praias?
(imagem retirada da net: Manet, "Ninfa surpreendida")

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terça-feira, 11 de agosto de 2009

K

papagaio

Sorri um sorriso
assim como
antigamente,
daqueles que parecem
já estar esquecidos.
O meu sorriso subiu
(como um papagaio,
daqueles verdadeiros,
pintalgados e tudo)
e poisou;
a criança apanhou o meu sorriso
e, entre dentes,
assobiou
como que amansando o papagaio;
nas sua mãos
o meu sorriso brilhava ainda mais
e silvava puro,
o encantamento do menino.

(...)

Lá longe,
o Sol piruetava
na alegria pura
daquelas onze horas da manhã.
(imagem retirada da net)

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segunda-feira, 10 de agosto de 2009

K

Geografias










Em distantes geografias,
em atalhos
só traçados por afectos,
vejo uma floresta,
três dunas
e cinco rochas;
tudo o mais
é um sonho,
que ri
da Lua
e de mim
que nunca serei geógrafo!...

(imagem retirada da net)

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K

Ibn Errik


Forjaste-nos no fragor da liça,
na vontade do teu pulso,
da tua fronte;
vergaste as dores de um império,
Deus confirmou-te!

(imagem retirada da net)

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domingo, 9 de agosto de 2009

K

Cá-las

Sinto em mim os compassos,
as notas em singular escalada;
sim, sobem
sobem sempre
em ritual augusto,
solene na majéstica figura.
Em seu redor,
as sombras recuam respeitosas,
reverentes;
alaga em luz e mistério
a boca de cena,
o auditório transido.
Timbra,
percute
o rosto,
o gesto vadio,
as mãos surdas,
o Mar Jónio,
a Grécia
sempre...


Norma, Medeia, Tosca, Lucia
abraçam-na
em oferta maternal,
risonha,
quando explode
"...chanter dix fois la même ópera... ça n'est-ce pas de l'art!!..."

(imagem retirada da net)

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sábado, 8 de agosto de 2009

K

musa

Olhei os musgos que escorriam
dos teus olhos;
rodopiei a vida
para que corresses à minha frente,
feita musa...
(imagem retirada da net)

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sexta-feira, 7 de agosto de 2009

K

onde?



Para onde foi minha alegria,
meu momento?
Para onde vai o fascínio,
o fractal do meu desejo?
Ainda estarei no percurso
das muletas subtis?
Respondi ao apelo,
à voz taciturna,
ao esquecimento,
às memórias que já
se desvaneceram;
corri o meu caminho,
a minha mordaz glória.
Lenta, insidiosamente
na espinha da noite,
vi os restos de mim,
semeados pelas telas vivazes
de um outro eu.
(imagem retirada da net)



quinta-feira, 6 de agosto de 2009

K

Piódão


Deste-me o xisto,
cravei o coração
de negro.
Amassei-o,
misturei-o
com a terra,
comparsa,
abracei-te e,
e fiz-te povoado.
No sopé da montanha,
ficaste calcada,
semeada.
Então,
na brancura da madrugada,
deste-me a igreja
que coroei no rossio
e a fiz alva
envolta em negro cetim.
E assim ficaste...
(imagem retirada da net)

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terça-feira, 4 de agosto de 2009

K

cana(l)










Sondei um velho canavial;
nada me disse,
a não ser o lento marulhar das águas,
o jambé morno do vento (...)

(imagem retirada da net)

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segunda-feira, 3 de agosto de 2009

K

dançar(-te)

... e dançámos
na noite de uma vida inteira,
não sei se te lembras:
mirava teu sorriso,
naquele cotovelo de rua,
enquanto sobrava sol
nos teus olhos;
dançávamos o baile antigo,
e as tílias derramavam-se
em sorrisos
à tua passagem.
Dava-te o braço
e ríamos,
ríamos muito,
apesar do tempo,
apesar dos outros,
apesar de nós...
subia o pano
das nossas lembranças:
o teu sorriso,
a nossa dança,
o gozo da vida,
como se a nossa alegria
fosse sempre nossa,
nunca se sumisse
por entre conversas escarninhas...

Fiquei aqui,
à beira da rua,
do cotovelo,
ainda abro os braços,
esperando uma dança
que já partiu,
há tanto tempo,
que só te recordo
o sorriso, os braços lânguidos,
a tua leveza surripiante...
Não!
Não voltes!
Não voltes mais!

(inspirado num poema de Baptista Bastos in moriana)
(imagem retirada da net, Renoir: "Dança na aldeia")

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domingo, 2 de agosto de 2009

K

quase soneto

Entre duas áleas te prostraste,
No caminho antigo que era teu,
Naquele vento norte ganhaste
Um raro carinho, um sonho meu.
Sorriste, já sem graça e sem afecto,
Sem tino ou presunção sequer
Mau grado meu abraço, meu tecto
Tão, fria, distante estás, mulher.

Vi ao longe teu desprezo,
Teu fastio quase derramado.
Hoje eu suplico, quase rezo
Para que esse teu ar enfeitiçado
Seja um sonho tão desmaiado
Que eu o esqueça de tão desbotado.

(imagem retirada da net, "Toilette" de Toulouse-Lautrec)


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"[...] Apesar de tudo o que se passa à nossa volta, sou optimista até ao fim. Não digo como Kant que o Bem sairá vitorioso no outro mundo. O Bem é uma vitória que se alcança todos os dias. Até pode ser que o Mal seja mais fraco do que imaginamos. À nossa frente está uma prova indelével: se a vitória não estivesse sempre do lado do Bem, como é que hordas de massas humanas teriam enfrentado monstros e insectos, desastres naturais, medo e egoísmo, para crescerem e se multiplicarem? Não teriam sido capazes de formar nações, de se excederem em criatividade e invenção, de conquistar o espaço e de declarar os direitos humanos. A verdade é que o Mal é muito mais barulhento e tumultuoso, e que o homem se lembra mais da dor do que do prazer."

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